sábado, 16 de maio de 2009

A revolução de Jacques Prévert

há um poeta imóvel

no meio da rua.

não é anjo bobo

que vive de brisa,

nem é canibal

que come carne crua.

não vende gravatas,

não prega sermão,

não teme o inferno,

não reclama o céu.

é um poeta apenas

sob seu chapéu.

à sua volta, o trânsito

escorre, raivoso,

e o semáforo muda,

célere, os sinais.

mas o poeta não sai

de seu lugar. jamais.

diz um padre: - “é pecador.

blasfemou, praticou

fornicação, assalto.

por castigo ficou

atado ao asfalto.”

diz um rico: - “é anarquista,

que mastiga pólvora,

que bebe cerveja

e espera a explosão

da bomba sobre a igreja.”

diz um soldado: - “ é agente

de potência estrangeira.

aguarda seus cúmplices,

ocultos em algum

lugar desta ladeira.”

diz um doutor: - “ é vítima

de mal perigoso.

está paralítico,

ou talvez nefrítico,

ou então leproso.”

ante notícias

tão contraditórias,

há queda na bolsa,

pânico na sé.

cai o ministério,

e foge o doutor,

o padre, o soldado,

o rico, o ministro,

o governador.

sem donos, o povo

livra-se de impostos,

sem padres, o povo

livra-se da missa,

sem doutores, o povo

livra-se da morte.

as ruas se animam

de vozes, de cores,

de pessoas, pregões,

abraços, canções.

e, no meio da rua,

sob seu chapéu,

sob o azul do céu,

o poeta sorri, completo,

feliz.

José Paulo Paes

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Os muros da discórdia

Abaixo nota assinada por movimentos sociais e organismos de Direitos Humanos

NOTA: CONTRA O APARTHEID DOS MUROS CARIOCAS

Foi na década de setenta do século passado, durante o apartheid racial na África do Sul, que nasceu a idéia de utilizar veículos blindados para gerir o controle de populações urbanas. Chamado de “Yellow Mellow”, este blindado, que hoje se encontra no Museu do Apartheid, se tornou referência mundial para as estratégias de militarização de áreas urbanas segregadas, inspirando, em conseqüência disso, a ascensão da atual “política caveirão” por parte das autoridades públicas brasileiras.

Se o “Caveirão” é hoje o grande emblema do modelo militarizado de segurança pública que vem encharcando de sangue favelas do Rio de Janeiro, o recentemente anunciado projeto de levantamento de 11 quilômetros de barreiras de concreto no entorno de 11 comunidades é um sintoma claro do processo de criminalização da pobreza que vem permitindo afirmar a figura legitimadora da “vida descartável”. Além de muros de 3 metros de altura, o Governo do Estado pretende erguer muros "virtuais": um sistema de monitoramento com imagens de satélite para fiscalizar os espaços populares. O argumento oficial é a contenção da devastação da Mata Atlântica pela expansão das favelas, com os muros recebendo o nome de “ecolimites” – uma jogada macabra que utiliza uma bandeira ambiental para legitimar estratégias que reforçam a atual lógica do apartheid social.

No último sábado, dia 25 de abril, foi realizado um plebiscito pela associação de moradores da Rocinha para consultar a opinião da população sobre o projeto dos muros nas favelas. Na votação, a obra foi rejeitada por 1.056 pessoas. Apenas 50 votaram a favor e cinco anularam o voto. Ao tomar conhecimento da pesquisa, o prefeito Eduardo Paes não titubeou em classificar o resultado como “suspeitíssimo”, buscando deslegitimar o plebiscito usando a velha tática de criminalizar as organizações populares das favelas. Assim também foi a repercussão dada à correta deliberação da FAFERJ – Federação das Associações de Favela do Estado do Rio de Janeiro – que rechaça a suspensão dos muros.

As entidades de Direitos Humanos, militantes sociais e pessoas preocupadas com os claros indícios e sinais de cristalização de segregação social, vem a público se manifestar em apoio à posição da FAFERJ e se comprometem em lutar, juntos, contra toda forma de criminalização da pobreza e dos movimentos de resistência. CONTRA O APARTHEID CARIOCA: NÃO AOS MUROS!

sábado, 2 de maio de 2009

A legitimidade do terrorismo no plano internacional

Este texto surgiu de uma brincadeira na faculdade. A rígida professora de Metodologia da pesquisa jurídica pediu que cada aluno apresentasse oralmente seu tema para a monografia. Eu e um amigo da turma (que faz parte desse blog porém não quer se identificar, não sei o porque, mas também não se pergunta o porque de alguém não querer se identificar..) combinamos de apresentar temas “estranhos” , só para ‘sacanear’. Ele apresentaria o tema “amor e Direito” e eu “a legitimidade do terrorismo no plano internacional”. A brincadeira serviria também para causar reflexões na turma. Para nossa felicidade, a professora esqueceu-se dessa tarefa e não exigiu a apresentação. Para que o pensamento não se perca eu resolvi escrever. Os pensamentos que se seguem são produtos da insânia. Alguns poucos bons argumentos surgirão no meio das asneiras. Sem problema, a asneira é a melhor forma de causar uma reflexão. Quem nunca refletiu após ler uma pérola do Diogo Mainardi? Ou ouvir uma do Pelé?

Toda lei é justa? Essa é a pergunta mais comprometedora para o Direito e seus filósofos da razão legislativa. Ninguém jamais ousou respondê-la de forma afirmativa. Não. Nem toda lei é justa. Para os anarquistas, o indivíduo só deve seguir a uma lei que ele próprio ajudou a ‘escrever’; sendo este meio de produção legislativa (com participação de todos), o único com legitimidade para criar uma regulação objetiva da liberdade. Mas não vivemos em um “estado anarquista” (você sabe o porquê das aspas!). A democracia representativa, base de legitimação dos estados contemporâneos, possui seus meios próprios de construção do direito. Alguns decidem, e os outros exercem sua liberdade de acatar as decisões. Ah! Mas e o voto secreto, direto e universal?? Esse é o direito de escolher o molho com o qual seremos devorados. Se mudasse alguma coisa, seria proibido.

O que fazer então quando nos deparamos com uma lei injusta? A resistência pacífica é a primeira alternativa, mas será facilmente reprimida como sempre foi em toda a história da humanidade, com raras e belas exceções. Nesses casos a violência é o único meio de alcançar os objetivos. Alguns exemplos são as revoluções francesa, haitiana e americana. Do ponto de vista da ordem legal anterior essas ações eram vistas como terroristas; devido a globalização e a nova dinâmica internacional se faz necessária um expansão desse argumento tendo a ordem jurídica internacional como plano de fundo. Assim os grupos fundamentalistas islâmicos estão lutando pela instauração de um mundo mais justo a partir de seu ponto de vista. Uma ação é considerada terrorista tomando-se sempre um dado paradigma e utilizando a teoria do livre arbítrio para avaliar as condutas humanas. O livre arbítrio é a possibilidade de escolha entre o bem e o mal, os conhecendo como tal. Dessa forma o determinismo de quem delinqüe é equivalente ao determinismo de quem pune.

Do ponto de vista de uma minhoca um prato de macarrão é uma orgia. Claro que um prato de macarrão não deixará de ser um prato de macarrão só porque a minhoca é retardada, míope ou tarada. Se ela olhar de longe, dirá: “eba! Uma orgia! Me dei bem!”, mas ao se aproximar verá que não era bem o que estava pensando. E algum ser humano dotado de ‘razão superior’ dirá “isso é macarrão!”. Claro que a minhoca não concordará, afinal, o que é macarrão? Não faz sentido chamar aquilo de macarrão. A minhoca dirá que aquilo é.....sei lá, “thubaruba”! Isso! A minhoca vira e fala: “isso não é macarrão, é thubaruba!”. Então o ser humano irá impor à força sua sabedoria, obrigando a minhoca a aceitar que aquilo é macarrão. Então a minhoca será obrigada a ‘mofar’ se transformando na minhoca do Worms, sacará sua bazuca e entrará em guerra com os homens. A língua é também uma lei, uma codificação. Aceita em determinado espaço e tempo. Estar obrigado a seguir uma lei é estar condicionado à uma realidade. Aceitar isso é uma questão de opção política. Cabe a cada um decidir.

Perguntas:

E se as leis forem proibidas por lei? Então só os fora-da-lei terão leis.

E se o casamento for proibido por lei? Então só os fora-da-lei terão sogro e cunhado.

Será que valeria a pena ser um fora-da-lei?